Saturday, April 22, 2006

Idosos etc


Claro! A gente envelhece e fica mais preocupado com os idosos, antes devidamente ignorados. Envelhecer no Brasil de hoje não é fácil. Por isso escreví Envelhecer em tempos de cólera no JB em 28/ABR/2005
Outro artigo foi publicado no jornal do Brasil, chamado Para sempre e fala das relações entre pessoas de diferentes idades, sobretudo de mulheres mais velhas do que seus companheiros

Para sempre


FELIX BERARDO, GERONTÓLOGO da Universidade da Flórida, conta que apresentou uma ex-aluna, com dois ou três casamentos que não deram certo, a um professor bem mais velho que se aposentara por problemas de saúde. Achava que ela poderia se beneficiar de uma relação com uma pessoa mais madura e estável, e que ele teria um pouco de alegria num momento difícil. Meses depois, os dois se casaram e mudaram para outra cidade. Após sete anos Felix recebeu um convite para ir ao funeral dele. Sem graça por havê-los apresentado, além dos pêsames de praxe, tentou se desculpar. Ela não deixou que ele terminasse, dizendo:
“Não diga bobagem: foram os sete anos mais felizes da minha vida. Faria tudo outra vez”.
A história de C.H., um brasileiro, é muito diferente. Tinha estudado nos Estados Unidos e
passado muito tempo em vários países. Dava aulas numa federal onde conheceu um casal que desejava estudar fora. Conversou muito com eles e os orientou. Quinze anos mais tarde, casualmente, a reencontrou. Ela estudara e passara algum tempo em países onde ele também vivera. Divorciada, tivera alguns relacionamentos fracassados e se dedicava à profissão. Saíram algumas vezes. Tinham muito em comum, começando com a importante experiência nos Estados Unidos, México e Costa Rica. A militância contra a ditadura trazia lembranças que os uniam. Tinham uma ampla cumplicidade. O sexo era importante e bom, mas nunca fora central na vida dos dois. Não obstante, um dia ela terminou a relação, explicando: “Para sempre... Nós, mulheres, sonhamos com relacionamentos e casamento para sempre”. Tudo dava certo, mas ela não poderia buscar uma relação “para sempre” enquanto estivessem juntos. E, com ele, o “sempre” seria mais curto.
Quantos relacionamentos entre pessoas com idades ou em estágios de vida diferentes não são vividos, ou não são vividos em sua plenitude, porque buscamos algo “para sempre”? “Para sempre” e “infinito enquanto dure” são duas posturas comuns, mas quase opostas: a primeira combina a fantasia e o dirigismo sobre o romance; a segunda aceita que somos contingentes e nossos romances também. Seus seguidores praticam o abandono. O romance, que tem dinâmica própria, decide seu próprio fim. A transcendência estaria na intensidade e não na duração. Essa postura, romântica, tem outro tipo de problemas, em particular para os filhos: não basta que o amor entre os pais seja “infinito enquanto dure”. Eles pagam um alto preço pelos divórcios.
As sociedades regulam as relações de seus membros de maneira variada, inclusive o que deve ou não deve ser igual. Em muitas, o gênero deve ser diferente, masa idade deve ser semelhante, assim como a raça e classe social.
Essas normas são heranças antigas. Porém, os padrões de relacionamento são afetados pela demografia. A esperança média de vida cresceu muito: em 1940 era de 45,5 anos e está perto de 72, um ganho de 26 anos. Essa é a esperança ao nascer; os que chegam aos 40 tem uma esperança bem maior. Apareceram os “novos velhos”, de corpo novo e alma nova, mas muitas atitudes e valores ficaram defasados. Se, em 1940, quem passava dos 45 estava no lucro e se comportava como tal, hoje, na mesma idade, as pessoas tem quatro décadas ativas pela frente. Profissionalmente, aos 40 há mais tempo pela frente do que para trás, depois de terminados os estudos. A “crise dos 40”, que indicava o início da velhice, hoje marca o fim da juventude.
Há mais velhos e os velhos de hoje são diferentes. Muitos se rebelaram contra o rótulo de velhos. Contudo, a ampliação da vida não foi igual para homens e mulheres. A violência criou um excedente feminino: entre 1979 e 2002, foram assassinados 645.165 homens e 61.085 mulheres, criando um déficit de mais de 580 mil homens. As mortes violentas, por causas externas, foram ainda maiores: 1.961.219 homens e 418.248 mulheres, criando um déficit de mais de um milhão e meio de homens. Em 2000, o excedente de mulheres era de 2,5 milhões, mas chegará a seis milhões em 2050. Entre 50% e 60% do déficit de homens se devem à
violência. A diferença entre a esperança de vida de homens (66,7) e mulheres (74,3 ) atingiu 7,6 anos em 2000. A violência, muito concentrada em homens jovens e pobres, criou um excedente de mulheres igualmente jovens e pobres, parcialmente represado social e espacialmente,
afetando os padrões de relacionamentos. Aumentou o sexo (e a paternidade) itinerante dos
homens, diminuiu a fidelidade de todos. Cresceram as famílias com filhos de pais diferentes. Algumas mulheres pularam a cerca da idade e/ou a da geografia social em busca de amor e segurança, ainda que como a segunda (e até terceira) companheira.
Porém, as fantasias não se ajustam automaticamente às mudanças demográficas, condenando muitas mulheres a prolongada solidão. O preconceito contra as relações com ampla diferença de idade é muito maior se a mulher for mais velha. Mas essas relações entre o outono e a primavera podem dar certo? Podem. Vera e Berardo, em 1985, derrubaram dois mitos, demonstrando que os casamentos com muita diferença de idade eram mais frequentes entre os pobres (e não, como se acreditava, entre velhos ricos e mulheres jovens) e que não eram nem mais nem menos felizes do que os com pouca ou nenhuma diferença de idade. Barbara Lovenheim afirma que o estresse da vida moderna está matando muitos americanos e que muitos homens jovens que amam mulheres bem mais velhas enfatizam que a independência e a
maturidade da mulher reduzem muito o estresse que existe nos relacionamentos. A vida “lá fora” já tem estresse demais.

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