Friday, April 28, 2006

Suicídios

Os suicídios são área de interesse acadêmico e humano. Tive a oportunidade de conhecer pessoas maravilhosas, que construíram muito em suas vidas, que amaram e ajudaram outros, que pensaram seriamente em terminar suas próprias vidas em algum momento. Conhecí outras que se mataram. Promessas que nunca se completaram. Por isso estudo e pesquiso o tema, tendo , inclusive, iniciado pequena polêmica com jornalistas a partir de artigo que publiquei n'O Globo, baseado no que transcrevo a seguir:

MÍDIA, SUICÍDIOS E CONTÁGIO

Detalhar, na mídia, um suicídio não é, apenas, uma questão de mau gosto, de falta de respeito com o suicida e a sua família: é, também, um estímulo a outros suicídios. Recentemente, Madelyn Gould fez uma revisão, publicada nos Anais da Academia de Ciências de Nova Iorque, das pesquisas sobre as relações entre a divulgação de suicídios pela mídia e a elevação das taxas de suicídio. Ela descreveu quarenta e uma pesquisas baseadas em casos reais e e vinte e oito baseadas na divulgação de casos fictícios (como em telenovelas). Organizando os dados, vejo que os suicídios aumentaram em 71% dos casos reais divulgados e em 57% dos casos fictícios. Os aumentos discutíveis representam outros 12% dos casos reais e e 18% dos fictícios. As pesquisas com casos reais foram feitas em nove países e as com casos fictícios em quatro. Outra pesquisa, de Hampton, feita em hospitais psiquiátricos e postos de emergência imediatamente após a divulgação de um suicídio usando um determinado ingrediente, mostrou que 20% dos que tentaram afirmaram terem sido levados à decisão pelo caso contado e outros 10% decidiram usar aquele ingrediente, mas a decisão já teria sido feita. O conhecimento de que a divulgação de suicídios aumenta a probabilidade de novos suicídios, levou vários países a implementar recomendações à mídia, entre eles Alemanha, Australia, Áustria, Canadá, Estados Unidos, Japão, Nova Zelândia, Suiça, além de apoiados pela Organização Mundial de Saúde e o CDC – Center for Disease Control. Os resultados foram bons: na Áustria, os suicídios foram estudados por Etzersdorfer, Sonneck e Nagel-Kuess, que constataram uma diminuição de 7% já no primeiro ano, de 20% em quatro anos e nada menos do que 75% nos suicídios usando um meio comumente usado em Viena. Há ampla evidência de que alguns suicídios se agrupam no tempo. Dificilmente há ondas, mas há clusters, termo usado pelos pesquisadores que poderíamos traduzir por agrupações. Também há evidência de que mulheres e jovens são mais suscestíveis ao contágio. Outras pesquisas focalizaram a matéria, chegando à conclusão de que o destaque, tamanho e repetição das publicações também influenciam o aumento de suicídios: quanto maior, pior. O Brasil necessita de uma série de diretrizes, baseadas na experiência de pesquisadores em países diferentes e não em chute. Infelizmente, o suicídio é bastante comum e as taxas estão crescendo em algumas faixas de idade. É, realmente, notícia? Algumas diretrizes, adotadas e sugeridas por especialistas internacionais, incluem limitar o destaque e o tamanho, não colocar fotos, evitar detalhes e, sobretudo, evitar informações sobre o meio e o local, evitar tratar o suicídio como algo que ele não é – um ato misterioso em pessoas normais, comuns; um ato heróico, romântico, ou racional – e enfatizar o que ele é com muita frequência: o resultado de problemas mentais que podem ser tratados com sucesso. Uma ação construtiva é dar informações sobre onde há e como encontrar tratamento. Não se trata de ocultar os suicídios, nem de ofensa à liberdade democrática. Há, todos os dias no nosso planeta, um infinito de ações humanas, comuns e correntes, muitas delas felizes. Não são noticiadas. Jornais, rádios e televisão selecionam e têm que selecionar. Ninguém parece achar que não publicar os risos e as alegrias são uma forma de censura, mas eles raramente são notícia. A ocultação é um fenômeno diferente, é deixar intencionalmente de publicar algo cuja existência pode afetar a população, como fez a ditadura militar, ocultando uma epidemia de meningite. Existe, também, ocultação quando a mídia, voluntariamente ou coagida, deixa de publicar informação para preservar um governo ou até um sentimento de exagerado patriotismo, como foi e continua sendo o caso da cobertura da guerra no Iraque nos Estados Unidos. Diferem, e muito, de evitar a publicação de suicídios ou seu destaque sabendo que, em si, a publicação pode causar malefícios. Violar diretrizes que evitam mortes com um olho nos indicadores de audiência e publicidade é pior do que engano e incompetência, é safadeza.

Gláucio Ary Dillon Soares

IUPERJ e CESeC


3 comments:

Anonymous said...

Eu tenho vontade de me matar, e posso certificar que isso não foi influnencia da mídia, mas concordo plenamente que quanto mais comentários são feitos à respeitto desse assunto, mais encorajadas ficam as pessoas a cometerem suicídios. E infelizmente isso não acontece só em relação à suicídios... qualquer coisa que seja bastante e bem divulgada são muitas vezes banalizadas e repetidas por pessoas (principalmente leigas e de pouca personalidade), mantendo então coisas talvez nã tão boas cada vez mais comuns e populares.

GLAUCIO SOARES said...

Essa carta não tem enderêço para resposta. Podemos, apenas, torcer para que Aline encontre gratificação na vida e desejo de viver. Em verdade, creio que pessoas como Aline podem ajudar muito e não apenas serem ajudadas. Ela pode ter insights, uma compreensão de um processo que é difícil ser compreendido por quem não passa por ele. Sinto isso como paciente de câncer - dificilmente uma pessoa que não passou por essa experiência consegue aquilatar o que é esse diagnóstico.

Anonymous said...

Gostaria que quem tivesse interesse e estiver realizando pesquisas sobre o tema entrasse em contao comigo pelo email: janaguedesjornalismo@gmail.com.
Também estou estudando o assunto para realizar minha monografia (Suicidio na mídia), e seria de suma importância qualquer contato com vocês.
Forte abraço!